FIGUEIRAL
O cunhado do Zé da Rosa:
- Isso é reco bravo que ali anda, enquanto lá houver figos, não te sai de lá!
O tio Tibério igual:
- Quando ali plantaste aquele figueiral, disse-te logo “é longe do povo e para ali sempre houve muitos recos, comem-te os figos todos”
E todos alinhavam na mesma cantilena.
Nã!...
Ele também já tinha visto muitos rastos e percebia alguma coisa. Os rastos não eram de reco e se fossem, tinham que ser muitos recos.
Já era o quarto ou quinto dia que ali passava a hora da sesta, a suar que nem um burro, ali naquele figueiral. Que para ali alombrava, termo de baixo, parecia o inferno. A olhar ao longe, com o calor, pareciam labaredas brancas que nasciam do chão, até a olhar queimava. Fontelas, só ao fundo das oliveiras do Valverde.
Mas tinha que descobrir como é que os cacarelos desapareciam debaixo das figueiras.
O raio da mulher: “- que secavam no chão e depois era só escaldá-los, que já iam secos e que não tinham tanto trabalho e que trabalho já eles tinham demais -”. Isso não era mentira.
Mas por este andar!...
Mas por este andar, nem secos nem moles. E depois, no inverno, onde estavam os figos para comer a acompanhar a chicha gorda fria? Só de pensar, encheu-se-lhe a boca de saliva. Se não tem ido na conversa, tinha-os acarrado e secavam no quinteiro como das outras vezes e pronto.
Pareceu-lhe ouvir alguma coisa. Apurou o ouvido, nada. Já lhe parecia ouvir coisas.
Não! Agora ouviu um chocalho.
“- Gado! A estas horas…”
“- Não estão acarradas!”
“- Qual é o maluco que traz o gado aqui para baixo a esta hora? Gosta pouco do gado…”
Amouchou-se atrás duma fraga.
“- Olha! Queres ver?”
As ovelhas, parecia que conheciam a sota. Corriam, apesar do calor, direitinhas às figueiras!
“- Ora cá está!”
Pastor, nem vê-lo. Aguentou escondido, já as ovelhas pastavam há algum tempo os cacarelos, quando apareceu.
“- Olha que figurão! Então és tu?”
Apesar de ter vontade de começar logo a discutir com ele, até lhe apeteceu rir.
“- Diziam que era o reco! E que reco!”
“- Então é aqui que tu as fartas, afinal não descobriste ouro!”
E esperou.
Agora é que o apanhava, ainda estava a vê-lo a passar no povo, todo concho, a ouvir:
- O Manolo sabe tratar delas!
- Ele lá descobre onde as farta!
- Não há cá igual!
Ali estava o segredo. Era a comer nas figueiras dos outros, pela hora do calor, estava tudo metido em casa e ele a fisgá-la.
Viu-o encarrapitar-se numa figueira grande, virado para o caminho. “- Olha o lapantim, a ver se vem alguém!”
- Não tenhas pressa, deixa fartar o gado!
O Manolo ia caindo da figueira abaixo, ficou branco como a cal da parede.
- Ó Senhor Aprígio, olhe que é a primeira vez! Calhou, passei por aqui, elas fugiram-me…
- Cala-te! Não digas mais mentiras! Eu vi como o gado correu para as figueiras! E ouve com atenção o que te vou dizer: tiras daqui o gado agora e nunca mais aqui as metes. E quando ordenhares, durante este ano, metade da ordenha da noite fica em minha casa. E não se fala mais nisto! Ouviste?
- Sim, senho Aprígio. Fique certo disso.
Atirou um assobio seco e o gado seguiu atrás dele, em direcção à Terra Grande.
“- Maldito figueiral! Mas onde é que havia de as fartar? Está tudo seco…
“- Rais parta a vida dos pobres!